terça-feira, 26 de agosto de 2008

Cafu é meu

Eu, Ewerton Clides, tenho notado um fenômeno muitíssimo interessante.

Uma coisa que lhes adianto, é: não sou o único que notou o fenômeno muitíssimo interessante.

É o fenômeno dos livros que debatem a relação entre cães e donos de cães. Começou com o dono do Marley. Não quero nunca ler o livro que ele escreveu, mas achei tão aprazível que o título do livro seja Marley e eu. Eu achei bonito não pelo título em si, senão porque ele disse o nome do cão e não disse o dele. Eu sei o nome do Marley e não sei o dele.

Foi um ato de uma humildade estupenda. Se não fui de humildade, foi de burrice. Mas prefiro pensar na humildade, já que ela inspirará os leitores nesta tarde de terça-feira.

Mas este texto é para explicar que a moda começou quando surgiram boatos de que eu, Ewerton Clides, estaria fazendo um livro deste tipo. Não era verdade. Porém, as pessoas não se preocupam com a veracidade quando há o nome Ewerton Clides no meio.

Inspirado pelo boato, comecei a fazer um livro sobre minha profunda relação de carinho e afeto com meu cão, quando me dei conta que teria graves problemas autorais. O nome dele é Cafu. O Cafu, jogador de futebol apenas mediano, não perdoaria e processar-me-ia de modo inapelável. Portanto coloco aqui neste belíssimo blog um pequeno trecho do esboço do meu livro. O nome do livro seria: "Cafu é meu". Vamos ao trecho.

"Cafu é o cachorro mais burro que já conheci. Demorou cinco anos para aprender a sentar seguindo ordens. E demorou mais 13 anos para abrir portas sozinho. É claro que a porta tinha que estar entreaberta para ele abrir. Mas ele esticava a patinha, abria, e mesmo eu, Ewerton Clides, não ousaria lhe dizer:

- Cafu! Não foi você que abriu! Na verdade, a porta já estava entreaberta.

A ousadia, eu teria. Mas não perderia meu tempo, porque Cafu é burro e não sabe decifrar as palavras humanas.

Cafu morreu.

Se antes eu sonhava qualquer coisa, acordava e vivia o Cafu, depois disso eu passei a sonhar com o Cafu, acordar e viver qualquer coisa. Esta frase, plagiei de André Cintra. Claro que é muito sentimental, e não é sociologicamente viável em um texto. Claro também que não corresponde à realidade, já que sonho sempre com Juliana e vivo Juliana. Mas é muito, muito bonita."

O ônibus de Ewerton Clides

Perguntam sempre a mim, Ewerton Clides, o porquê de eu andar sempre de ônibus, não de carro, moto, motovan e de bonde.

Sempre digo que a motivação maior é a de que em ônibus, é possível que se faça um maior número de estudos sociológicos. Posso ver uma criança conversando com a mãe e fazer-lhe alguns questionamentos; posso sentir o nervo acirrado do motorista quando passa por uma lombada, ou até mesmo a angústia do cobrador quando não há troco possível.

Tudo isso me seria impossível em carro, moto, motovan e em bondes. O carro me sufoca. Me sinto tão apertado, que me dá vontade de desabotoar minha camisa marrom, num tremendo desvio sociológico! Além de balançar e me dar vontade de tomar dramin.

Não sei dirigir motos. Assim, tenho que abraçar o motorista. Não abraçava nem minha avó, vou abraçar o motorista?! O pior das motos é que elas me obrigam a abrir as pernas, numa exposição terrível.

Motovan, eu não sei o que é. E bondes já não existem mais.

Mas o que mais me espanta, que me deixaria de cabelos em pé se eu tivesse cabelos, é a desatenção profunda do leitor.

Você, leitor, me imaginou em um ônibus repleto de gente. Quanta desatenção, minha gente! Mas quanta desatenção, repito, minha gente!

O leitor não imaginou que meu ônibus é privativo. Só eu ando nele e observo pelas janelas todo o mundo sociológico por fora.

Imagine eu, Ewerton Clides, andando em um ônibus, de pé?!

Saibam que também sou ecologicamente correto. Ouvi dizer que andar de ônibus é muito mais conveniente à natureza do que andar de carro.

A faxineira e eu

Há um certo tipo de faxineira que detesta tudo o que faz.

Pode limpar esplendorosamente o quarto do vice-presidente da república, arrumando perfeitamente a coleção de pedras antigas que estavam jogadas no armário, alisando a roupa de cama para que o sono fique ainda mais agradável e deixando o carpete subliminarmente cheiroso. Pode cumprir outros itens que lhe garantam elogios casuais ao presidente, que não se gaba de sua capacidade.

Claro que a organização das pedras antigas não estão genericamente organizadas, de modo que qualquer entendido saiba se localizar. A organização das pedras desta faxineira fictícia é feita para que somente o vice-presidente — também fictício — saiba onde está cada pedra.

É um serviço que pode somente ser feito depois de muitos anos de serviços prestados ao senhor vice-presidente. E também com muitos estudos sobre localizações macro geográficas e micro geográficas. Pensei em dizer que este trabalho é resultado de muitas broncas, mas se a nossa faxineira levasse uma bronca, somente uma, pediria demissão. Porque faxineiras deste tipo são sensíveis.

Por isso que eu, Ewerton Clides, sempre falo aos que perderam a paciência com as faxineiras que, se elas continuam trabalhando, é porque não são boas faxineiras. A boa faxineira é sensível, orgulhosa e pediria demissão.

Pois eu, Ewerton Clides, ao contrário do tipo de faxineira mencionado neste mesmo texto, adoro tudo o que faço.

Até mesmo este texto é adorado por minha pessoa. Confesso que o reli até esta parte por várias vezes, todas com lágrimas por trás dos óculos.

Uma vez, tive uma pedra no rim que me fez doer demasiado. O doutor me disse:

- Ewerton Clides, extinguiremos esta pedra a laser!

Eu lhe respondi que:

- Não, doutor! Não tem como abrir meu rim para tirar esta pedra? Fui eu que fiz!

A operação foi marcada para o dia seguinte, e o doutor notou assim que a viu pela primeira vez, que uma pedra de Ewerton Clides é preciosa demais para ser expelida naturalmente.