quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Formigas afogadas

Certa vez, quando eu, Ewerton Clides, tinha vinte anos, uma das serviçais de minha casa derramou água em minha fazenda de formigas. Morreram todas, e afogadas.

É claro que chorei. E é claro que só o fiz quando ninguém olhava. Chorei às pitangas pelos cantos, lamentando as formigas que nos cantos já não estavam. Nunca mais eu poderia impedir a fuga daquelas formigas.

- Mas Ewerton Clides, por que você não comprou outra fazenda de formigas?

Não comprei, porque eu sentia falta, repito, daquelas formigas, não de formigas simplesmente.

Porém, não sei se a época das pitangas se foi. Mas acontece que parei de chorar às pitangas. E nesta hora, o leitor menos arejado, mais distraído, poderá pensar que "o Ewerton Clides agora está bem! Agora o Ewerton Clides não está mais triste."

Engano do leitor, tão relapso, tão indolente.

Leitor, aprenda comigo, Ewerton Clides.

Há uma grande escala que vai da tristeza profunda à alegria suprema. E sempre estamos situados em algum ponto no meio desta escala. A gente chora, leitor, quando desce. E quando lê um livro de sociologia, ou se está apaixonado, esta sensação é a de subida.

E depois, se pára de chorar porque se acostumou com a vida triste sem a fazenda de formigas. Se parou de chorar, mas se vive muito mais triste.

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